Entre 1955 e 1960 eu estudei no Grupo Escolar Thomaz Antonio Gonzaga, na esquina da rua Pedro de Toledo com a rua Rio Grande do Sul.
Nesses 5 anos, frequentei 3 anos o período da manhã; das 8:00 as 11:00; fiz o 2o. ano durante no segundo-período, das 11:00 às 14:00 e o período da tarde começava as 14:00 terminando as 17:00.
Durante esses 5 anos, me lembro que, algumas vêzes, a rotina escolar foi quebrada para algum acontecimento extraordinário. Me lembro quando a Coca Cola chegou em Marília. A companhia compareceu ao Grupo e distribuiu garrafinhas-chaveiros da Coca, além de distribuir réguas vermelhas com o logo-tipo da companhia. Não sei se isso era legal. Provavelmente não fosse. Imagina uma companhia de refrigerantes estrangeira chegando numa escola estadual, parando toda atividade escolar para fazer sua propaganda corporativa. Quem seria o governador de então? Carvalho Pinto ou outro político de direita, sem dúvida.
Mas, deixando a Coca Cola de lado, as vêzes, as aulas eram dispensadas e os alunos eram levados à alguma comemoração cívica acontecendo na Avenida ou outro lugar público.
Pelo menos 2 vazes, eu me lembro que os alunos do Grupo Escolar inteiro foram caminhando em fila indiana em direção ao Cine Marília, tendo abarrotado as dependências daquela casa de espetáculos. É gozado que não se precisava de autorização dos pais das crianças para as desviarem de seu currículo escolar.
Uma dessas vezes nos foi exibido um filme sobre os milagres de Nossa Senhora de Aparecida. Era um filme branco-e-preto mostrando as cenas mais manjadas das várias lendas relacionadas à Santinha.
Passado aproximadamente um ano, lá fomos nós do TAG, em fila, em direção ao Cine Marília novamente. Dessa feita era uma promoção da Kolynos, dentifrício mais popular do país. Não sei como tudo isso ainda está gravado em minha memória, mas foi a Kolynos que nos levou ao Cine Marília, e dessa vez para assistir um filme alemão realizado em 1955, chamado 'Dois olhos azuis' (Zwei blaue Augen), direção de Gustav Ucicky. Antes do filme projetaram alguns comerciais da Kolynos.
Marianne Koch & Claus Holm fazem o par romântico.
Fraulein Koch & director Gustav Ucicky; a ceguinha e o engenheiro.
Fraulein Koch & director Gustav Ucicky; a ceguinha e o engenheiro.
Nós, crianças marilienses, estávamos acostumados a assistir filmes em cinemas barulhentos e lotados. O zum-zum de crianças conversando ou fazendo estrepulias nunca parava, mas assim mesmo eu não perdia o fio da história. Eu diria que 95% dos filmes nos anos 1950 eram em branco-e-preto. Raramente passava-se filme colorido nas matinees.
Talvez 'Dois olhos azuis' nunca tivesse ficado retido em minha memória se não fosse algo espetacular que acontece nos últimos 5 minutos de projeção dessa história de amor, passada em Hamburg, entre uma ceguinha, sua mãe super-protetora e um engenheiro galã pelo qual a ceguinha se apaixona.
Lá pela metade do filme, resolve-se que a ceguinha irá se submeter a uma operação para tentar reverter sua situação de total escuridão. O drama vai se arrastando até os últimos 5 minutos, quando, finalmente lhe tiram as vendas dos olhos. E é justamente aí que acontece o milagre... A película que já passava de uma hora de duração se transforma em TECHNICOLOR assim que Marianne Koch percebe que consegue ENXERGAR as cores...
Que maravilha!!! Não me lembro exatamente o que se passou na platéia do cinema, já que não houve os gritos costumeiros de quando o mocinho bate no bandido. Mas houve uma total surpresa entre todos que estavam acostumados ao branco-e-preto e de-repente viram cores brilhantes na tela gigante do Cine Marília.
Foi um acontecimento inesquecível. Tão inesquecível que me lembro até hoje... passados mais de 40 anos.
Marianne Koch, linda alemã, chegou a tentar Hollywood, sem muito sucesso.
A grande surpresa (e sacada) de 'Dois olhos azuis' é justamente nos 5 minutos finais, onde tudo se torna colorido, como a capa dessa revista alemã com a estrelinha Marianne Koch, que esteve no Brasil para o lançamento de 'Zwei blaue augen' em 18 Novembro 1959, em São Paulo; Em 1955 essa cena era considerada 'romântica'. Hoje seria vista com desdém pela maioria do público.